sexta-feira, 28 de outubro de 2011

O DESAFIO DO CORREÇÃO FRATERNA NO MINISTÉRIO PRESBITERAL DE JOÃO CRISÓSTOMO.


O desafio da correção fraterna no ministério presbiteral de João Crisóstomo


Irmã Ângela Tutas

Uma das mais delicadas tarefas do presbítero no exercício do seu ministério pastoral é a correção dos erros e das falhas dos fiéis. É difícil porque se exige coerência e sabedoria.

Na minha missão aqui em Belém, duas vezes senti dificuldade em aplicar a assim chamada correção fraterna. Senti-me movida pela consciência nesse esforço para não acontecer que fique no que chamamos de "omissão". A maior dificuldade que senti foi devido também ao fato de que a correção tinha que ser direcionada num contexto de atuação relacionado à celebração do culto e as pessoas que estão por dentro sabem como se devem apresentar nesses momentos. Se sabe, mas não se faz.

A primeira vez foi quando participei de uma celebração e leitoras chamaram atenção da comunidade pelas roupas impróprias. Na Igreja há orientações sobre a decência, de maneira especial, dos que servem no presbitério e ajudam o celebrante. Até quando foi só a minha impressão sobre o decote, não dei muita importância, mas como observei que outras pessoas da comunidade sentiram a inconveniência, no final da Santa Missa, fui tomar uma posição com relação ao fato. De inicio, a pessoa me escutou, mas para ter a certeza de que não podia se apresentar daquela forma me disse: "Falarei com o meu pároco, e se ele autorizar, sim que vou continuar do mesmo jeito". Enfim, fiquei confiando nas mãos de Deus o meu agir. Ao voltar outros dias na mesma Igreja, e ao ver a pessoa agradeci a Deus, pois a mesma estava devidamente trajada.

No segundo exemplo cito a apresentação de uma ministra extraordinária da comunhão com uma saia extremamente curta. Isso despertou a atenção dos fiéis e tive o mesmo posicionamento do exemplo anterior, diferenciando apenas que a pessoa logo, não somente me agradeceu pela observação e deu-me um abraço.

Acrescento o terceiro exemplo, mais recente, de uma cantora que se apresentou com um vestido muito por cima dos joelhos. No final da celebração ao falar particularmente com ela sobre a beleza e os dons com quais Deus a presenteou, mas que podia não agradá-lo devido à indecência, a mesma me agradeceu pelo carinho de eu lhe falar tais coisas, porque não tinha percebido por este lado. Isto me consola ao perceber como os ensinamentos de Crisóstomo continuam atualizados.

Ele fala da dificuldade não somente em aplicar a correção fraterna, mas também quando o presbítero tem a responsabilidade de tirar as almas do caminho dos vícios. Segundo Crisóstomo não deve "aplicar castigo na medida dos pecados cometidos, mas é preciso tomar em conta a intenção dos pecadores; caso contrário, querendo consertar algo quebrado, aumentar-se-ia a fenda aberta, e, em vez de levantar o pecador, seria lançado para dentro de um abismo mais profundo".

Em relação às pessoas envolvidas nos prazeres mundanos, e, orgulhosas de sua nobre ascendência e posição influente, Crisóstomo recomenda ao presbítero, sobretudo o silêncio e a brandura. Mesmo que não se consiga afastá-los totalmente de seus vícios, pelo menos o será em parte, de modo progressivo. Todavia, com o rigor e aspereza na aplicação do castigo, impossibilitar-se-ia qualquer melhora. Pois um homem a quem se obrigou a perder a vergonha e a não mais enrubescer, torna-se totalmente insensível, não presta mais ouvido às palavras de outros, não se deixa mais impressionar nem por ameaças nem por benefícios, sendo, no final, pior do que a cidade do qual fala Jeremias 3,3: "Assumiste o aspecto de prostituta e profanaste a terra com teus vícios e devassidões".

Aqui entraria o exemplo de drogados e da devassidão que assola o mundo. Por tudo isso, o pastor precisa de uma profunda compreensão e de um olhar aguçado para perscrutar de todos os lados o estado da alma das pessoas.

Assim como muitos, deslumbrados, desesperam de sua própria salvação, porque não suportam a amargura do medicamento, assim há outros que, dispensados de penitência adequada à gravidade de seus pecados, perdem-se na leviandade, tornando-se piores e caindo em pecados sempre mais graves.

Crisóstomo segue a mesma linha de Santo Ambrósio, que foi nesse sentido um excelente pastor de uma autoridade ilibada. Quando o imperador Teodósio ordenou o massacre de Tessalônica, na qual foram mortas mais de 700 pessoas, o bispo de Milão teve a coragem de enfrentá-lo. Quando este, mesmo advertido por Ambrósio, entrou na Igreja acompanhado de sua corte, Ambrósio o impediu corajosamente dizendo: "Não ousaria, em sua presença, oferecer o sacrifício divino". Diante disso o imperador invocou o exemplo de Davi, mas Ambrósio ficou firme em recriminá-lo publicamente perguntando-lhe se aquela boca que ordenara tão cruel massacre era digna de receber a hóstia sagrada. Por fim, exigiu-lhe imitar Davi não só no pecado, mas, também, na penitência, pois "o pecado só nos é tirado pelas lágrimas e pela penitência" (Carta 51).

Compreendemos como é mister que o sacerdote tenha um profundo conhecimento da realidade do pecado e das suas conseqüências na vida dos fiéis, de qualquer nível social, que lhe foram confiados, examinado tudo da maneira mais adequada, a fim de que seus esforços pastorais não sejam frustrados.

Mas não somente isso; também a recondução dos membros separados da Igreja exigir-lhe-á grandes cuidados como é fácil de compreender. O presbítero é como um pastor de ovelha que tem total domínio sobre o seu rebanho. Se ele for um ótimo guia as ovelhas o seguirão ao menor sinal. E mesmo que alguma se afaste do caminho certo, basta um chamado pouquinho mais alto para reconduzi-la ao rebanho.

Trazendo para a realidade do sacerdote, caso um fiel se tenha afastado da verdadeira fé, ele deverá empregar grande esforço, persistência e paciência. Pois pela violência não conseguirá reconduzi-lo, nem mesmo o medo o obrigará; somente a força da persuasão será capaz de trazê-lo à verdade abandonada. Daí precisar o sacerdote de uma alma heróica para não desanimar e desesperar da salvação dos errantes. "É com suavidade - diz Crisóstomo - que deve educar os opositores, na expectativa de que Deus lhes dará não só a conversão para o conhecimento da verdade, mas também o retorno à sensatez, libertando-os do laço do diabo, que os tinha cativos de sua vontade" (2Tm 2,25-26).

Caridade e cura espiritual são as qualidades essenciais exigidas por Cristo para um verdadeiro pastor das almas: "Quem é, pois, o servidor fiel e prudente? (Mt 24,45)" Crisóstomo destaca a superioridade do carisma da paternidade espiritual no exercício do ministério pastoral: "Pois aqueles cujo cristianismo se restringe à própria pessoa, também limitam a utilidade do trabalho apenas a seu proveito próprio; o trabalho eficiente das funções pastorais, porém, deve estender-se ao bem do povo todo".

Segundo Crisóstomo a ação do presbítero em relação ao cuidado das almas é bem superior a todas as obras de caridade que o cristão pode oferecer. Por que isso? Porque se trata de um trabalho direcionado ao crescimento espiritual e a salvação das almas. "Realmente apresenta alguma utilidade aos outros quem distribui dinheiro aos pobres, ajuda de alguma maneira aos necessitados, mas tanto menos do que o sacerdote, quanto o corpo é inferior à alma". Oxalá todos os presbíteros e os fiéis entendessem a grandeza do ministério presbiteral e vivessem de acordo com o que Cristo espera deles! Com razão, pois, Cristo declarou que a cura pastoral, ou seja, "o cuidado prestado a seu rebanho é medida de amor que alguém tem por Ele".

Fonte: Voz de nazaré

Nenhum comentário:

Postar um comentário