segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

'IR AS CAUSAS E NÃO FICAR ..."


“IR AS CAUSAS E NÃO FICAR SÓ NOS PALIATIVOS”

Questionar, tentar remover as causas da miséria da fome e não ficar só atingindo os efeitos de forma paliativa reside toda a luta da Igreja.
Não podemos mais nos contentar só em socorrer de forma paternalista as necessidades prementes.

Evidentemente que, as urgências devem ser socorridas. A quem está morrendo de fome não se vai fazer discurso de justiça social... nós temos que dar o pão.
É hora de atacar as causas, mudar os sistemas injustos, as estruturas de pecado que levam a injustiça.

É hipocrisia, fingimento, falsidade ou diria até, comodismo de alguns, para não dizer, safadeza, profanar a Palavra de Cristo quando dizem:
“Pobres sempre tereis entre vós” (Mateus 26,11), achando que isso possa servir como um anestésico na consciência.

A estes que pensam assim, é bom lembrar-se de lerem o que Jesus irá dizer depois, em Mateus 25,44-46: “malditos, afastai-vos...”
Os pobres, a justiça social, sempre foi bandeira do evangelho, sempre foi escopo da Igreja de Cristo.
Ocorre que querem fazer a Igreja se calar, se fechar nas sacristias. Alguns meios de comunicação se metem a dar lições de doutrinas evangélicas, teológicas, bíblicas e pastorais. Não perdem ocasião para difamar a Igreja com interpretações maléficas e mentirosas.

Colocam o seu poderio de comunicação para berrarem contra qualquer ação da Igreja que beneficie os pobres e cobre a justiça social.
A Campanha da Fraternidade que se iniciou na quarta feira de cinzas com o lema: “Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro”, quer levar todos os cristãos a refletirem a respeito da situação de injustiça social que está de forma estampada para todos verem e que marginaliza nossos irmãos mais necessitados.

É preciso entender que, a injustiça não é uma situação conjuntural, não é um estado de coisa que deva ser resolvido com paliativos ou esmolas para matar a fome. É um mal de estrutura. Injustiça estruturada, institucionalizada e orquestrada.

É bom lembrar que, no tempo de Jesus, a esmola era um meio privilegiado, integrado no sistema econômico para, remediar a injustiça. Dar esmolas, fazer de todo os bens individuais uma doação, podia ser a maneira de se fazer irmão dos indigentes, assumindo-se, portanto, sua situação ou seu estado (Atos 2, 42 – 47).

Não se tinha, ainda, consciência da alienação produzida por gestos de assistência. Não se tratava, ainda, de assumir ações coletivas para a transformação da sociedade.

Hoje, somos ainda solicitados a dar esmola. E é preciso confessar que certas situações dramáticas nos obrigam a esmolar. Mas sabemos que estes gestos supletivos não nos tornam irmãos das pessoas assistidas, mesmo quando, cheio de boas intenções, nós assim o desejamos.

Isto porque, objetivamente, aquele que dá e aquele que recebe não estão no mesmo nível...

É importante trabalhar pela instauração de uma sociedade que não fabrique mais pobres, isto é, por uma sociedade em que se realizem condições objetivas para que os homens se tornem livremente irmãos.

Precisamos de outras estruturas econômicas, outra maneira de ser cristão. Não se trata apenas de fidelidade a uma palavra “dê esmola”, cuja realização tranqüiliza a consciência.
É preciso acabar com uma sociedade baseada na exploração de uns pelos outros, no tirar proveito do outro pela sua condição social.

Portanto, a ação da Igreja, solícita e responsável, fiel ao evangelho, deve mesmo ir às causas e gritar por mudanças profundas e não contentar-se com o paliativismo.

A missão da Igreja de Cristo é denunciar tudo aquilo que se opõe a justiça do Reino. Denunciar tudo aquilo que se opõe à construção de uma sociedade melhor, justa e fraterna.

Em Gálatas 3,28, Paulo exprime bem a nova dimensão de uma existência, plenamente humana, revelada por Jesus.
“Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher, pois todos vós sois um só em Cristo Jesus.”

Mas, os privilégios têm suas raízes profundas. O mundo só se modifica lentamente. Nosso sistema social permanece, profundamente, marcado pela subordinação da mulher ao homem, dos pobres aos ricos.
O direito ao trabalho não é o mesmo para um e outro. A “organização social” é tal que, muitos subordinam suas vidas às tarefas subumanas, degradantes.

A miséria de muitos, procede em parte, da ganância de poucos que, num verdadeiro corporativismo, levam a muitos a condição de verdadeiros indigentes.

Nossa sociedade, infelizmente, permanece dominada pelos poderosos e gananciosos que, tiram da mesa dos pobres o “pão de cada dia’ deixando para estes, as “migalhas” que levam a desigualdade social.

A Igreja é, diretamente, desafiada todos os dias por esta desigualdade social, pelos privilégios de alguns.
Jesus questionou, bastante, fortemente os privilégios e as hierarquias que, a sociedade judaica estabelecia, tanto no domínio social, quanto no domínio religioso.

Pela sua solidariedade com os pecadores, com os pequenos, com os sem – lei, com os impuros, Jesus contestou fortemente as estruturas de uma sociedade que ousava se apoiar em Deus para justificar a separação entre aqueles que ensinam e os que escutam entre os que decidem e os que obedecem entre os que devem ser honrados e os que devem ser excluídos ou condenados a uma condição de miséria.

O contexto modificou-se, mas, não mudou muito a realidade das coisas. A sociedade continua tendo, como sempre teve seus marginalizados, excluídos, desclassificados, aos que ela (sociedade) dá apenas o direito do silêncio, da mordaça na boca.

Ainda não aprendemos a nos colocar à mesa para comer com os excluídos, marginalizados, para ouvi-los. É preciso entender que, paliativismo, simpatia e generosidade, não bastam para a transformação da história e como conseqüência, da sociedade.

É necessário buscar, a partir de agora, com a reflexão da Campanha da Fraternidade viver uma mudança real com o máximo de lucidez política e uma coragem profética enraizada na Palavra do Cristo.

Que a Luz do Espírito Santo possa conduzir o povo de Deus, dando a todos nós sabedoria e discernimento, afim de, acolhermos o Reino de Deus em nossas vidas e em nossa história.

Diácono Luiz Gonzaga
Arquidiocese de Belém – Pará/ Amazônia – Brasil.

diaconoluizgonzaga@gmail.com
diaconoluizgonzaga.blogspot.com.br

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